quinta-feira, 10 de agosto de 2017

Ensaios sobre o Reino de Deus - Parte II

Matheus Viana

Em qual terra? No ser humano e, consequentemente, em toda a criação. Foi neste princípio que o apóstolo Paulo declarou: “A natureza criada aguarda, com grande expectativa, a manifestação dos Filhos de Deus” (Romanos 8:19). Antes de elaborar as questões aqui analisadas, Jesus elucidou: “O Reino de Deus é semelhante a um homem que lança a semente sobre a terra” (Evangelho segundo Marcos 4:26). Analogia perfeita. O Reino de Deus começa pequeno, pois começa nos seres humanos, cuja pequenez foi relatada poeticamente pelo salmista: “Que é o homem para que com ele te importes?”. (Salmo 8:4). Mas torna-se grande, conforme o próprio Jesus afirmou: “No entanto, uma vez plantado, cresce e se torna a maior de todas as hortaliças...” (Evangelho segundo Lucas 4:32).
    
Contudo, seu processo de crescimento e desenvolvimento possui um alicerce: “uma vez plantado...”. Por ser como uma semente, ele deve ser plantado/cultivado em nós. O culto racional não é meramente causa ou efeito. É as duas coisas ao mesmo tempo. Ele é o efeito do governo de Jesus Cristo sobre nós e é por meio dele (causa) que o Reino de Deus é disseminado e manifesto, conforme Jesus ordenou, a toda criatura (Evangelho segundo Marcos 16:15) e a todas as nações (Evangelho segundo Mateus 28:19), a fim de que toda terra seja cheia do conhecimento Dele (Isaías 11:9).
    
Eis um grave problema que a Igreja no ocidente enfrenta: Uma semente chamada entretenimento tem substituído a semente chamada Reino de Deus. Semelhantemente aos primeiros seres humanos, temos trocado a ética de Deus por uma ética contrária que vá de encontro aos nossos desejos por substituirmos o culto racional por um culto ególatra. A egolatria em si é indício de que o Reino de Deus não é operante no indivíduo. Descrição precisa da realidade humana atual.

Jesus não é mais apresentado como o único e soberano SENHOR, mas como uma espécie de “guru espiritual” que oferece soluções para os anseios humanos fúteis; como um “manager”, CEO ou “coaching” – confesso minha repulsa a estes termos presentes no contexto eclesiástico - cujos princípios são usados meramente para enriquecimento material; ou como um mero psicólogo consultado para resolver tensões emocionais e afetivas.
    
A grandeza do Reino de Deus nada tem haver com ufanismo, mas com universalidade – e não universalismo (o conceito de que todos, no final das contas, serão salvos). Ou seja, visa atingir pessoas de todas as nações, mas sempre de forma humilde, uma de suas características indeléveis. Este amplo alcance, portanto, não ignora as premissas preconizadas pelo próprio Jesus: “Entrem pela porta estreita, pois larga é a porta e amplo o caminho que leva à perdição, e são muitos os que entram por ela. Como é estreita a porta, e apertado o caminho que leva à vida! São poucos o que a encontram”. (Evangelho segundo Mateus 7:13-14).
    
Aqui é necessário um ajuste de termos. Grandeza não significa ufanismo, tampouco massificação do Evangelho. O fato de Jesus ter afirmado serem poucos os que entram no Reino de Deus, por sua vez, também não significa exclusivismo ou sectarismo. Dois extremos atualmente em voga. As multidões seguiam Jesus, mas Ele estava à procura de discípulos. E este mesmo princípio Ele passou aos Seus discípulos: “Portanto, vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando a obedecer a tudo o que eu lhes ordenei” (Evangelho segundo Mateus 28:19-20).
    
Nesta advertência, Jesus falou sobre os dois pontos que integram o Reino de Deus ao afirmar: “... vão e façam discípulos de todas as nações”. O fato de fazer discípulos simboliza o plantio da semente do Reino de Deus no coração do ser humano. Por sua vez, o fato de serem discípulos de todas as nações simboliza o longo alcance do germinar desta semente.
    
Muitos em meio à Igreja têm desejado multidões, o que culmina na descaracterização do Evangelho do Reino de Deus e no comprometimento do discipulado. A premissa básica que demonstra o intento de disseminarmos o Evangelho do Reino de Deus é o discipulado, conforme Jesus preconizou. No entanto, não há discipulado sem cruz. Palavras do próprio Jesus: “Aquele que quiser me seguir, negue-se a si mesmo, tome a tua cruz e siga-me” (Evangelho segundo Mateus 16:24).
    
O Evangelho, que é a base do discipulado ordenado por Cristo, não é atrativo para as multidões. Por isso a alternativa para os que as buscam é tentar a insanidade de extirpar a cruz de Cristo de modo a tornar o Evangelho do Reino atrativo. Impossível. A verdadeira conversão, o primeiro passo do discipulado, é fruto da ação do Espírito Santo no ser humano (Evangelho segundo João 16:8). O registro de Marcos em relação ao centurião romano que participou da crucificação de Jesus Cristo é pertinente neste sentido: “Quando o centurião que estava em frente de Jesus ouviu o seu brado e viu como ele morreu, disse: ‘Realmente este homem era o Filho de Deus’” (Evangelho segundo Marcos 16:39). Este centurião teve uma experiência com o Cristo crucificado. O Cristo o qual Paulo pregou (I Coríntios 2:2). Não há como desvencilhar Evangelho do Reino da cruz de Cristo.
    
Mas, infelizmente, ele tem sido substituído por um pseudo-evangelho regado a baladas gospel entre outros entretenimentos que nada tem haver com a liturgia do culto racional elucidada pelos apóstolos, parte fundamental da ortodoxia cristã. O resultado: multidões entorpecidas pelo entretenimento eclesiástico, convencidas de que são devotas a um cristianismo sem cruz, – algo cuja existência é impossível – completamente conformado com o sistema secular (Cf. Romanos 12:2). Sem Evangelho do Reino, não há discipulado. Sem discípulos, não há Igreja. Sem Igreja, não há instrumento para a manifestação do Reino de Deus sobre a terra (Cf. Evangelho segundo Mateus 16:18). Apostasia na certa.
    
Todavia, a Igreja Gloriosa de Cristo, Seu corpo na terra, triunfará. O Reino de Deus está em seu processo de crescimento sobre ela, embora completamente na contramão do “cristianismo pós-moderno”. Você é um membro dela?

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