sexta-feira, 18 de novembro de 2011

A soberania da vida


Matheus Viana

Entre uma notícia e outra...

Madrugada em claro em pleno quarto escuro. Acometido por uma dor que beirava o insuportável tomando minhas costas. Neste momento insólito, minha mente foi absorta em um turbilhão de pensamentos. A deformidade cujo processo de desenvolvimento não cessa, a absurda dificuldade em trabalhar, a incapacidade de exercer as funções de ‘homem da casa’, a condição precária de um corpo severamente frágil e desfigurado que gera uma vida repleta de limitações e muitas, muitas dores. O medo de meus sogros, demais familiares e pessoas próximas pensarem que eu, na verdade, não passo de um ‘vagabundo’ que usa a deformidade para fugir das responsabilidades...

A dor em meu corpo não o deixava repousar e o apuro de um intelecto aflito não proporcionou o descanso que tanto precisava. Neste momento, pensei no quanto já escrevi sobre o tema “vida abundante”. O sentimento de incoerência foi instantâneo. Como pude me atrever a escrever sobre algo ao qual não tenho a mínima experiência, autoridade e condição? Como posso falar sobre uma realidade completamente destoante, antagônica e paradoxal com a que vivo?

Minha qualidade de vida é quase zero! Em tudo o que faço tenho a companhia inseparável da dor. Da qual não posso reclamar na mesma intensidade em que ela castiga meu corpo. Pois corro o risco de ser interpretado como um hipocondríaco que quer chamar a atenção. Um vitimista que quer ser cortejado pela piedade e pela comiseração...

Por isso, prefiro dizer, mesmo fazendo algumas queixas que às vezes escapam “sem querer, querendo”, nas palavras do saudoso e inesquecível Chaves, que sinto pequenos desconfortos. Com meus pais, graças a Deus, posso desabafar toda minha inquietação. Eles me acompanham, desde o início, nesta árdua jornada e sabem o que enfrento. Com minha esposa, no entanto, confesso que extrapolo. “De zero a dez, quanto é a dor que você está sentindo?”, pergunta, com alta dose de preocupação. “185”, respondo, com verdadeiros “gemidos inexprimíveis”.

Contudo, meditando em tudo isso e olhando sob outra perspectiva, pude ver a verdade de que sei muito bem o que é viver esta tal de vida abundante. Clinicamente falando, era para eu estar morto. O veredicto de óbito já foi dado por vários médicos e por diversas vezes há alguns anos. A diminuição dos corpos vertebrais limitaria, simultaneamente, meus movimentos. A respiração excessivamente escassa – avaliada nos míseros 18% - por conta da curvatura óssea comprimir, consideravelmente, meus pulmões e também o diafragma. O encurtamento na espessura do líquido medular que pode comprometer meus movimentos e causar sérias lesões. E, não podemos nos esquecer do coração, cujo batimento foi alterado em virtude da cifose que também acomete meu tórax.

Em contrapartida, comecei a me lembrar do verdadeiro milagre ao qual sou protagonista. A forma como pude trabalhar por todos esses anos e, com a graça de Deus, juntar recursos – modestos, é verdade – para poder constituir um casamento sólido e feliz, apesar das dificuldades. Às vezes me pego no meio da noite contemplando minha linda esposa dormindo ao meu lado, andando pelo pequeno apartamento onde moro e observando os móveis que o compõe. Tudo isso é vitória! Quem diria? Um ser moribundo – pelo menos para os médicos – viver em um nível assim. Normal para qualquer ser humano. Mas sobrenatural para mim. Ou seja, a vida abundante divina repousa, de fato e de forma soberana, sobre a minha vida. Prova disto é o fato de que, mesmo convivendo com todas essas adversidades, estou vivo. E isso basta!

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