Matheus Viana
Obs: Caso não tenha feito, leia antes a parte I deste ensaio para melhor compreensão.
Sei
que alguns serão rápidos em refutar a reflexão do texto anterior: “Mas o
episódio de Pentecostes mostra que é possível conciliar multidões com o verdadeiro Evangelho.”
É fundamental notarmos que o número de pessoas batizadas foi aproximadamente de
três mil (Atos 2:41). No entanto, temos que evocar a estatística e empregá-la
no número total de pessoas que ouviram o discurso de Pedro.
Por
ser, na ocasião, a celebração de Pentecostes, estavam presentes cidadãos de
várias nações (Atos 2:8-11). Ou seja, embora a narrativa de Lucas não detalhe,
seguramente havia um número muito superior aos três mil que foram batizados.
Sendo assim, será que podemos chamar de multidão
estes três mil se este número for comparado a todos os presentes? Sim se
reconhecermos o valor do indivíduo diante de Deus.
Há
também os que dirão: “O sonho de Deus é o de ter muitos filhos semelhantes a
Jesus, conforme está escrito em romanos 8:29.” Sim, Deus deseja com que muitos sejam
salvos. Não advogo a causa de que apenas poucos serão salvos, embora também não
defenda o universalismo. Por isso me acusar de sectário ou exclusivista
é incoerente. O que abordo é que a prioridade do “alcance das multidões” não
pode estar acima da propagação do Evangelho. Pois, repito, o segundo aspecto deve
ser a causa e o primeiro o mero efeito, e não no sentido inverso como
ocorre atualmente. Neste caso, a ordem dos fatores altera o resultado.
Lucas
salienta o crescimento demográfico da Igreja: “Assim, a palavra de Deus se espalhava. Crescia rapidamente o número de
discípulos em Jerusalém: também um grande número de sacerdotes obedecia a fé.”
(Atos 6:7). Conforme vemos nos relatos anteriores, Pedro e os demais apóstolos
estavam comprometidos com a propagação do verdadeiro Evangelho. Tal crescimento
- que podemos chamar de vertiginoso -, no entanto, não era oriundo de um
evangelho corrompido e contaminado por uma autoajuda ineficaz como o que vemos
ser disseminado atualmente.
Tal
crescimento também era resultado do valor que eles davam ao indivíduo (Atos 2:46-47). Vemos que no glorioso episódio de Pentecostes cada
um dos presentes ouviu as maravilhas de Deus em Sua própria língua (Atos 2:7).
Deus ama o mundo (Evangelho segundo João 3:16), mas dá ênfase ao indivíduo
(Jeremias 1:5, Salmo 139:13). Jesus, como Deus, compreendia tal valor. Por isso
não poupou esforços em consolar Pedro, abatido pela depressão, de chamá-lo para
a suprema obra de apascentar Suas ovelhas (Evangelho segundo João 21:17). Não
importou em mostrar suas feridas, já ressuscitado, ao incrédulo Tomé (Evangelho
segundo João 20:27).
Jesus
respeita a individualidade, algo que a Igreja, no afã de “conquistar multidões”, abandonou. O fiel tem que se moldar ao
sistema eclesiástico vigente. Caso contrário, “atrapalha o processo de
evangelismo e conversão”. Por muitos anos não consegui me encaixar na
“engrenagem” de um destes sistemas. Por isso, permaneci “infrutífero”. Pela
misericórdia de Deus, foi me dada uma oportunidade de servi-Lo segundo os dons
que Ele me concedeu: escrita e ensino. Há alguns anos sou professor de ensino
religioso e capelão escolar em uma escola cristã, e de teologia sistemática no
seminário teológico da congregação onde frequento. Não pedi nenhum destes
cargos. Apenas minha individualidade foi reconhecida. E isso me permitiu ser
usado por Deus e, consequentemente, influenciar
pessoas.
Não,
não tenho uma “multidão” que me segue. Apenas poucos alunos que o Espírito
Santo, também através de minhas aulas, fez com que tivessem um encontro com o
Cristo das Escrituras que Paulo, ao elucidar sobre sua influência, adverte os
cristãos a seguirem. Não importa a quantidade. O que importa é que estas
pessoas estão seguindo a Cristo, e não propriamente a minha pessoa ou um
sistema humano qualquer. Aliás, não há outro “sistema” além do preconizado por
Paulo em sua carta aos efésios (Efésios 2:20-22).
Sim,
sei da responsabilidade de meu testemunho. Vigio para que o fazer e ensinar de Jesus (Atos 1:1) seja
vigente em minha vida (Tiago 1:22). E o fato de desejar que os meus alunos
sigam Cristo me compele a ser Seu referencial para eles. Portanto, minha parte
é apenas dar aulas e praticá-las com “temor
e tremor” (Filipenses 2:12). O restante é papel do Espírito Santo
(Evangelho segundo João 16:8-13).
Juntamente
com influência, o termo relevância também tem sofrido uma séria
distorção em seu conceito. Pois relevante,
de acordo com o senso comum vigente no meio evangélico, é influenciar o maior número possível de pessoas. E influenciar é definido como fazer com
que uma pessoa lhe siga. Por isso tentam mesclar o Evangelho com muitas
estratégias corporativas.
O
resultado? Uma teologia que ignora preceitos básicos da fé como renúncia e
arrependimento. Afinal, “tudo posso
naquele que me fortalece”, não é verdade? Não, não é. Pois não foi isso que
Paulo quis dizer em sua carta aos filipenses. Mas ensiná-los que em todas as
circunstâncias, tanto na abundância como na escassez, na alegria ou na tristeza,
Cristo é a Suprema fonte. No entanto, este caráter evidente no ensino de Paulo
é completamente destoante do teologismo neo-pentecostal, leia-se “teologia da
prosperidade”.
Termino
com a célebre influência de Judas,
irmão de Tiago, líder da Igreja em Jerusalém: “senti que era necessário escrever-lhes insistindo que batalhassem pela
fé de uma vez por todas confiadas aos santos.” (Judas 3).
Este
também é o desejo do meu coração e o propósito que me levou a escrever estes
ensaios.
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