O
que é normalidade? A tentativa de responder esta questão tem gerado, ao longo
da história, teses e livros, além de um interminável debate. Minha proposta é modesta.
É consenso que para definirmos se algo é normal, devemos ter como parâmetro um
padrão de normalidade. Eu, por exemplo, tenho um corpo anormal. Pois ele é
bastante diferente de um corpo considerado normal de acordo com o padrão
estabelecido pela ortopedia. Assim, o anormal é o contraponto – distante,
diferente - do que é normal.
Diante disso,
podemos afirmar que para definirmos o anormal, devemos conhecer o normal. Por isso, andamos a esmo no tocante a este imprescindível conhecimento.
Não sabemos o que é normal porque não conhecemos o anormal, e vice-versa. Esta confusão
é produto da latente relativização que a dialética trouxe à tona. Ela destruiu,
por exemplo, os dois princípios estabelecidos por Aristóteles para a construção
da dedução lógica – necessária para a definição do que é normal ou não é: o da
identidade e o da não-contradição.
É
óbvio que não podemos ignorar as definições de normalidade de culturas e
religiões distintas. A poligamia, por exemplo, é algo normal na cultura
islâmica. Já para a sociedade ocidental, majoritariamente pautada pelo
cristianismo, é considerada anormal, já que o normal é a monogamia.
No
entanto, a simples necessidade de se estabelecer normalidades para a vida em
sociedade, ainda que sejam divergentes, é reflexo da existência de uma
normalidade soberana. C.S Lewis preconiza que uma discussão entre duas pessoas
só acontece porque existe o senso de certo e errado. Quando, segundo Lewis,
dizemos que uma pessoa errou ao agir de determinada forma conosco, tal
afirmação está pautada por este senso. Pois, sem ele, nunca chegaríamos a esta conclusão
pelo fato de o conceito de “errado” simplesmente não existir. Lewis a denomina
como “Lei Moral”.
O
mesmo princípio se aplica à normalidade. Em nossa vida, tentamos definir o que
é normal e o que é anormal em virtude da existência da “Lei da normalidade”. O
normal para Aristóteles era pautado pela sua identidade. Se algo é “isso”,
então não é “aquilo” (princípio da identidade). Se é normal, não pode ser
anormal (princípio da não-contradição) e vice-versa. Já para Hegel, o normal
era a síntese do confronto entre tese e antítese. Ou seja, o normal só poderia
ser definido como tal após passar pelo processo dialético. Algo considerado
normal (tese) teria que colidir com algo considerado anormal (antítese). E
desta experiência o verdadeiramente “normal” surgiria.
Fórmula
contraditória. Conforme reza a dialética, só é possível ter uma síntese se
houver o confronto entre tese e antítese. Mas a tese, neste caso, só é possível
se definirmos o normal. Se já temos o trabalho de definir a tese, por que
submetê-lo à dialética se o intento é o mesmo: encontrar a normalidade? A
resposta é simples e, ao meu ver, absurda: a mera tentativa de negar a
existência de uma normalidade absoluta. Contudo, a simples necessidade de
definir o que é, de fato, normal, não importa a forma, é reflexo – e por que
não dizer desdobramento? – da existência desta normalidade absoluta.
Existimos porque ela
existe. O padrão de normalidade foi estabelecido ao homem no princípio de sua
existência. Se você acredita que o ser humano é resultado de um processo
evolutivo de milhões de anos, de um “ancestral” cuja origem foi a matéria
e a energia liberadas no universo no evento do “Big Bang”, saiba que a própria
ciência joga contra você. Segundo a Lei da Biogênese, matéria ou energia não
são suficientes para gerar vida. Vida só é possível quando gerada a partir de
um ser vivo. Um ser vivo, segundo a Lei da Termodinâmica, não pode surgir aleatoriamente,
do nada. Tudo o que existe no universo é oriundo de processos naturais. Estes
processos são submetidos às leis naturais. E estas leis não podem ter
surgido... de forma espontânea ou evolutiva. Pois seria contraditório ao
próprio princípio científico.
Tudo
o que existe no universo tem um propósito. Filósofos como Al Ghazali, Tomás de
Aquino e Leibniz, entre outros, debruçaram exaustivamente sobre o argumento
cosmológico Kalam, que preconiza tal
verdade. Sendo assim, as leis e os consequentes processos naturais, a
diversidade da vida e a natureza em si foram gerados por um ser inteligente
(capaz de formular leis e processos) e vivo (capaz de gerar vida). É exatamente
isso que o apóstolo Paulo preconiza em sua carta aos colossenses: “Pois nele foram criadas todas as coisas nos
céus e na terra, as visíveis e as invisíveis”. (Colossenses 1:16).
Não
foi diferente com o homem. A narrativa de Gênesis é clara: “Formou Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego
de vida, e o homem se tornou alma vivente”. (Gênesis 2:7). Formar é
diferente de criar. É fazer segundo um modelo, uma forma. O ser humano foi “formado”,
ou seja, feito de acordo com a forma/modelo da normalidade. Este era o
propósito. Antes da formação, foi estabelecido: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança”. E assim se fez. O
modelo foi o próprio Deus/homem: Jesus, a imagem do Deus invisível (Colossenses
1:15). Este foi o resultado do ser humano ter recebido do fôlego de vida do
próprio Deus - Seu Espírito – e também a capacidade de pensar, sentir, desejar
e escolher, ao qual chamamos de alma.
Mas
o ser humano deixou sua razão ser influenciada de modo a desejar o anormal. O
resultado não poderia ser diferente: a anormalidade existencial veio à tona. A
existência humana estaria fadada a ela. É sobre este drama que envolve a
humanidade que analisaremos...
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