Matheus
Viana
Não existe perfeição longe de Deus. A perfeição
refletida na natureza se perdeu por conta do ser humano cometer a insanidade de
buscá-la à revelia de Deus (Cf. Gênesis 3:17). A beleza que encontramos
hoje na natureza, que é suficiente para nos deixar atônitos, é uma pálida
demonstração da perfeição do Criador.
O
ser humano cobiçou e comeu do fruto ilícito por querer obter o conhecimento que
não lhe era devido e, consequentemente, ser como Deus. Isso mesmo: ele queria
ser como somente Deus é: Perfeito. A partir de então, o desejo se transformou
em necessidade. Por isso nos esforçamos para supri-la.
As
academias estão cada vez mais lotadas de pessoas ávidas para alcançarem o “corpo
perfeito”. Vemos tal necessidade se manifestar nas várias áreas da vida, como
por exemplo, nas artes e nos esportes. Há os que dizem - principalmente os
darwinistas, baseados em uma cosmovisão naturalista/materialista - que ela é
uma construção social. Se for, em que
momento da “evolução” ela começou a ser construída? Onde e quando a necessidade
de tal construção se originou? A falta de resposta a tais questões evidencia que
tal suposição é equivocada.
A
expressão usada no Novo Testamento Bíblico, traduzida como perfeito, é teleion, que
pode também ser traduzida como completo.
Perfeito também significa ser completo. Mas isso não significa
que ser perfeito é apenas estar completo.
Perfeição é a beleza que não é apenas
a maior entre todas, mas a que serve de parâmetro para algo que possua ou
alguém que deseja possuir tal característica. Lembrando que perfeição não é apenas um elemento de
cunho estético, mas também ético e, sobretudo, de essência.
Conforme
afirmou Tomás de Aquino, a necessidade de alcançar tal ideal tem origem em um Ser perfeito, cuja existência é necessária
para a existência da perfeição. Não
há como não recorrer ao argumento de René Descartes, mesmo desconsiderando todo
seu mecanicismo racionalista, de que uma mente que dúvida é imperfeita, pois se
duvida é porque não possui todo o conhecimento. Mesmo assim, ela tem a ideia de
que a perfeição existe. Baseado
nisto, Descartes afirmou que esta ideia não pode ter origem em algo imperfeito,
mas apenas em algo perfeito: Deus. Por isso, conforme afirmei no livro Culto racional, Deus indagou a Jó: “Quem deu sabedoria ao coração e
entendimento à mente?” (Jó 38:36). Óbvio que Jó sabia a resposta, assim como
você também sabe.
Certa vez
Deus propôs a Abraão: “Anda na minha
presença e seja perfeito.” (Gênesis 17:1). A expressão traduzida por perfeito é tamiym, que significa completo ou íntegro. Esta foi a expressão usada, por exemplo, em Gênesis 6:9: “Noé era um homem justo e íntegro (tamiym)
em sua geração. Ele andava com Deus”.
Noé vivia, com sua família, em
meio de uma humanidade severamente corrompida. Uma degradação tão intensa que
causou a ira de Deus e O levou a sentenciar: “Por causa da perversidade do homem, meu Espírito não contenderá com
ele para sempre.” (Gênesis 6:3). A narrativa é clara e detalhada: “O SENHOR viu que a perversidade do homem
tinha aumentado na terra e que toda a inclinação dos pensamentos do seu coração
era sempre e somente para o mal.” (Gênesis 6:5). Realidade semelhante à
descrita por Paulo em sua carta aos romanos (Romanos 1:21-24) e também à nossa.
Noé foi achado íntegro porque, mesmo vivendo em meio de
uma geração corrupta, “andava com Deus”.
Esta foi a perfeição que Deus propôs
a Abraão. Vemos em ambos os casos o princípio de que Presença de Deus e perfeição
são indissociáveis. Uma não é possível sem a outra. Assim, temos que concluir
que qualquer ideal de perfeição desprovido
de Presença de Deus é, além de
idolatria, uma ilusão.
Atrelada à necessidade de alcançar
a perfeição está a referência existencial, que é a
necessidade de ter como referência algo ou alguém em que você molda sua
existência, seja de forma inconsciente ou consciente. Um músico, por exemplo, busca a perfeição musical baseado na performance de outro músico que ele
julga possuir tal característica. O mesmo princípio está presente em outras
áreas.
O fato de Deus chamar Abraão
para andar com Ele e ser íntegro demonstra a veracidade deste princípio. O
homem foi formado à imagem e
semelhança de Deus. Ele (Deus) foi – e É – o modelo usado na formação humana. Por isso
o apóstolo Paulo revelou, em sua carta aos romanos, o propósito de Deus a nós
de vivermos conforme a imagem e semelhança de Seu Filho Unigênito, ou seja,
termos Ele como nossa referência
existencial (Romanos 8:29). Ele é
a imagem do Deus invisível (Colossenses 1:15). Assim, Ele é o Ser perfeito, a origem e modelo da perfeição. Por isso o apóstolo Paulo
afirmou: “Prossigo para o alvo, para o
prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus.” (Filipenses 3:14).
Esta soberana vocação é ser perfeito em Cristo. Algo redundante.
Não
há como separar a busca em ser perfeito do
motivo que a pavimenta. Por que queremos ser
perfeitos? O motivo é demonstrado pelo objeto que utilizamos como
referência. Se é Jesus, o Deus encarnado, veremos que uma das
características de perfeição é humildade.
No entanto, ela não existe sem o reconhecimento do pleno Senhorio de Cristo
sobre nós.
Como
um erudito judeu, conhecedor destes princípios, o apóstolo Paulo preconizou: “Nós o proclamamos, advertindo e ensinando a
cada um com toda a sabedoria, para que apresentemos todo homem perfeito (teleion)
em Cristo.” (Colossenses 1:28). Nosso
aperfeiçoamento se dá na medida em que conhecemos o Ser perfeito (Jesus) e nos submetemos a Ele. Tal conhecimento, no
entanto, se dá através da advertência e do ensino
de Sua Palavra (Evangelho segundo João 5:39). Entra em cena o culto racional.
Uma vez comprometido o
ensino sobre quem Jesus, o Ser perfeito, é; a obtenção do conhecimento da perfeição também se compromete, não indo
além da consciência de sua existência. Por isso estamos muito longe de sermos
perfeitos, a fim de que o mundo veja Jesus em nós, a esperança da Glória
para um mundo corrompido como o que Noé viveu e que Paulo experimentou e
relatou, e por isso advertiu: “A natureza
criada aguarda, com grande expectativa, que os filhos de Deus sejam revelados,
não pela sua própria escolha, mas por causa da vontade daquele que a sujeitou,
na esperança de que a própria natureza criada será libertada da escravidão da
decadência em que se encontra, recebendo a gloriosa liberdade dos filhos de
Deus.” (Romanos 8:19-21).
Por isso, devemos atender a
advertência de Jesus: “Sede perfeitos
como perfeito é o vosso Pai celeste.” (Evangelho segundo Mateus 5:48).
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