Matheus Viana
“... porque, tendo
conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe renderam graças, mas os
seus pensamentos tornaram-se fúteis e o coração insensato deles obscureceu-se.” (Romanos 1:21).
Realidade
permanente. Eis um paradoxo concernente a ela: o racionalismo moderno é
irracional. Explico. Ele é o exercício da razão que considera apenas o ponto de
vista natural, anulando completamente o metafísico
ou sobrenatural. A questão é que a
origem da razão é metafísica. Quando
você pensa apenas sobre a perspectiva
natural, não vê a realidade por completo. Por isso o naturalismo é considerado reducionista. Uma regra básica da filosofia é a de
que aquilo que podemos perceber apenas com os nossos sentidos não é a realidade
completa. Mais do que isso: a atividade do pensamento
não é possível sem algo sobrenatural.
Platão dizia, em sua dialética mundo
inteligível (ou das ideias) e mundo
sensitivo, que a própria razão é algo além dos sentidos (percepções naturais). Por isso é capaz de
analisá-los e julgá-los. No entanto, quem julga e analisa a razão?
Conforme advertiu
Allister McGrath: “Não é de se admirar que Blaise Pascal tenha argumentado que
existem dois erros fundamentais do pensar: excluir a razão completamente e
aceitar nada mais do que a própria razão”[1].
Falemos sobre o segundo erro.
A
neurociência analisa a atividade cerebral (ação das sinapses
neurais), mas não o pensamento em si
(o que causa a ação das sinapses). Pois o pensamento
é algo abstrato, por isso metafísico, embora
seu resultado possa não ser. A
psicologia, em suas várias vertentes, identifica o comportamento do indivíduo
e, por meio dele, analisa seu pensamento
(a causa do comportamento). Mas não é capaz de analisar a origem do pensamento. Embora o pensamento seja a causa dos
comportamentos, ele também é efeito de uma causa. Portanto, qual é esta causa?
Assim como o próprio pensamento, ela
é metafísica.
Portanto,
quando rejeitamos o metafísico
estamos, ainda que de forma inconsciente, afirmando a impossibilidade do pensamento como ato. Mas se um indivíduo
pensa para elaborar uma sentença
racionalista, qualquer que seja, ele está negando
algo, por vezes sem perceber, que utiliza. É semelhante a um indivíduo dizer
que o ar não existe sem se dar conta de que sem o ar não seria capaz de fazer tal
afirmação, ou qualquer outra. Isso é contraditório, ou melhor, autorrefutável. Veja
a afirmação: não existe verdade. Como
posso acreditar em tal sentença, já que verdade
não existe? Deste modo, ela não pode ser... verdadeira.
Percebem a contradição? Tal sentença afirma a existência daquilo que ela diz
não existir. Isso não é lógico. Não ser lógico é um sintoma de irracionalidade.
(Ver livro A racionalidade da fé cristã, de J. P. Moreland).
É
este o fundamento do que o homem moderno chama de razão. O apóstolo Paulo, ao analisar a realidade em que vivia,
descreveu o fato de que o pensamento das
pessoas de seu tempo tornou-se fútil pelo fato de desconsiderar sua origem:
Deus. Lembremo-nos da pergunta feita a Jó: “Quem
foi que deu sabedoria ao coração e entendimento à mente?” (Jó 38:36).
Ao
vermos um bolo em uma forma, não podemos concluir que a forma, por si só, gerou
o bolo. Ela apenas recebeu a massa informe e deu-lhe uma forma no sentido
estético. A mente humana apenas
formula as ideias que temos. Mas de onde elas vêm? A mente não é capaz, por si
só, de gerá-las. Apenas dá-lhes formas,
que chamamos de pensamento. Lembremo-nos
de Descartes (e a origem da ideia de Deus na mente humana, no livro O discurso do método). Verdade que não
pode ser desconsiderada da razão.
Como
não é possível negar Deus fazendo uso da razão, os que estão firmes neste vil e
insano intento visam condicionar o comportamento do ser humano de modo que ele
aja sem o uso da razão. (ver o livro Maquiavél Pedagogo, de Pascal Bernardin).
A
valorização do sentimento em
detrimento do pensamento é consequência
deste fato. Os jovens de hoje não são movidos por ideias, mas por sentimentos.
Isso é refletido, por exemplo, na música. O estilo emocore, comum entre o público infanto-juvenil, é a suma – embora
não seja a única - demonstração. A música funk
é composta de letras que, regidas pelo ritmo característico, despertam
apenas os impulsos sexuais do ouvinte. Não há necessidade de pensar (refletir) sobre
que o está sendo dito, tampouco sobre os valores e as consequências de suas
ações. Há apenas a de ouvir e, levado pelo balanço,
fazer o que a música condiciona o ouvinte: prática da luxúria (leia-se
relações sexuais desenfreadas) e da ostentação.
Neste
ímpeto, surge o vale-tudo, já que a
forma de pensamento vigente
desconsidera Deus e, com isso, relativiza absolutos éticos e morais. Se a
música diz que tenho que ostentar riquezas para ser aceito na sociedade a qual
vivo, e isso determina meus sentimentos (desejos), os fins passam a justificar
os meios. Delinquência juvenil não é mais vista como algo errado a ser tratado
desde a raiz e devidamente punido caso necessário. Mas uma mera característica
da juventude moderna, como experiências “necessárias” para sua formação como
cidadão. Absolutos biológicos são relativizados em detrimento do subjetivismo construcionista. Em contrapartida, comportamentos passam a possuir caráter
genético.
Há
uma linha ideológica (teoria Queer) que preconiza que gêneros sexuais são
construções sociais impostas sobre indivíduos. Por isso, a pedagogia moderna
diz que é necessário que os pais e educadores não construam comportamentos e
costumes éticos que possam determinar o gênero das crianças, mas deve deixá-las
escolher o que querem ser por elas mesmas. Se alguém nasce com a ordem cromossômica xy, com todos seus atributos, por
exemplo, isso não quer dizer que ele seja do sexo
masculino. Ele decidirá quando lhe for conveniente. Desta
forma, como devemos classificar tal indivíduo? Não deve classificá-lo sob
nenhuma “nomenclatura de gênero”, pois qualquer classificação é vista como um
instrumento de opressão. Viva a ideologia marxista nos moldes gramscinianos. É
a descaracterização do ser humano, fruto da absurda relativização que temos
vivido. E esta escolha de gênero é pautada pelos sentimentos do indivíduo. Não
há lugar para razão, pois ela evoca padrões biológicos e antropológicos. E qualquer padrão é... instrumento de opressão. Mas tal afirmação, apesar de equivocada não é, em si mesma, um padrão?
Leia também: Cérebro e religião.
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