Matheus
Viana
A
fé cristã nasceu sob a pressão de uma intensa marginalização. Era vista pelos
judeus como uma espécie de dissidência. Mas não era esta sua essência. Jesus foi
visto de tal forma pela cúpula religiosa de Sua época, embora tenha vindo para cumprir
toda a Lei dada por Deus através de Moisés a fim de colocá-la sobre a Sua perspectiva
(Evangelho segundo Mateus 5:17, Romanos 6:14). Veio romper com a devoção
baseada nos ditames da Lei do Talião a fim de estabelecer uma devoção baseada
em Seu fazer e ensinar. Isto é discipulado (Cf. Evangelho segundo Mateus 28:19).
Isso é ser testemunha (Cf. Atos 1:8).
A
Igreja Primitiva, dirigida por Jesus através dos Apóstolos (os verdadeiros, Cf.
Evangelho segundo Mateus 16:18, Efésios 2:20-22), era vista como um grupo de
insurgentes. Alister McGrath afirmou:
“É quase certo que no princípio o
cristianismo tenha sido visto simplesmente como mais uma seita, ou grupo,
dentro do judaísmo (...). No entanto, apesar do cristianismo ter as suas
origens dentro do judaísmo, que era visto como uma ‘religião legal’ (religio licita) pelas autoridades
romanas, as comunidades cristãs não eram reconhecidas como legítimas.”[1].
A
história se repete. Vários séculos após a Igreja se tornar a instituição
oficial do cristianismo, há uma classe de cristãos ávidos por viverem o
cristianismo genuíno que estão à margem desta pseudoigreja que se apresenta atualmente como Igreja. São aqueles que se levantam contra a tendência de monopólios
humanos e oligarquias espirituais que se tornam cada vez mais uniformes. Não me refiro aos desigrejados, mas àqueles que desejam
ver a verdadeira Igreja se manifestar sobre a terra e cumprir o propósito que
Deus a outorgou.
O
contexto atual é semelhante ao que Jesus enfrentou. Certa vez, alguns fariseus lhe
questionaram sobre o fato de Ele e os seus discípulos não lavarem as mãos antes
de comer. A narrativa dos fariseus é flagrante: “Por que os seus discípulos não vivem de acordo com a tradição dos
líderes religiosos?..” (Evangelho segundo Marcos 7:5). Esses religiosos não
seguiam a Lei de Moisés, mas a tradição oral de homens conhecida como talmud. Por isso Jesus, citando o
profeta Isaías, declarou: “Este povo me
honra com os lábios, mas o seu coração está longe de mim. Em vão me adoram;
seus ensinamentos não passam de regras ensinadas por homens.” (Evangelho
segundo Marcos 7:6-7).
Realidade
triste, mas atual.
Jesus
é a essência do Evangelho. Esta essência é manifesta em Sua ética e, por fim, em Sua estética. Ou seja, a vida plena de Jesus
deve pautar a nossa forma de pensar (I Coríntios 2:16) e sentir (Filipenses
2:5) – ética - e consequentemente
agir (Romanos 8:29) - estética. Mas,
infelizmente, a essência tem sido
substituída por preceitos humanos, sejam eles modelos eclesiásticos ou
doutrinas teológicas. Sim, a doutrina é importante. Mas ela deve ocupar o lugar
da ética, nunca da essência, que é e sempre será Jesus Cristo
(Evangelho segundo João 5:39).
Há
muitos casos de congregações que estão pautadas em modelos eclesiásticos de evangelismo
em massa e gestão de pessoas. O expressivo aumento no número de cristãos no
Brasil não é desdobramento de crescimento, mas de inchaço. Inchaço é sintoma de
enfermidade e crescimento é sinal de desenvolvimento. Se a Igreja estivesse
crescendo, sua atuação e consequente influência sobre a sociedade seriam positivamente
notórias. Não é esta, portanto, a realidade. Repito, a Igreja está provando de
um grave inchaço. Pois está acometida por uma enfermidade chamada pseudo-evangelho.
Jesus
não tem ocupado o lugar da essência.
Ele tem sido relegado ao mero papel da
ética, o que tem gerado um fundamentalismo insano que está mais preocupado
em consolidar o juízo divino do que espalhar as boas novas da salvação. Ou ao
papel da estética, onde É usado
apenas como um subterfúgio para que o desejo dos líderes (leia-se pastores e “apóstolos”)
de obterem poder, riqueza e fama seja realizado.
Tudo
isso elimina a tão necessária diversidade do Corpo de Cristo. O apóstolo
Paulo, perseguido tanto pelo judaísmo como pelo império romano, elucidou sobre
ela em sua carta aos coríntios ao falar dos dons concedidos pelo
Espírito Santo (Cf. I Coríntios 12, Efésios 3:20). Alister McGrath, sobre isso,
afirmou:
“Embora seja correto falar do cristianismo
primitivo como uma tradição única, talvez seja melhor pensar nele como uma rede
complexa de grupos e indivíduos que existam em diferentes contextos sociais,
culturais e linguísticos. Estes grupos procuravam relacionar a sua fé a esses
contextos e expressá-la em termos que fizessem sentido dentro daqueles
contextos.” (...) “... Contudo, essa observação histórica não nega a ideia de
que havia um fio unificador no cristianismo primitivo.”[2].
No
dia 31/01, fui gentilmente convidado para trazer a reflexão nas Escrituras em
um grupo de cristãos chamado Núcleo de
Pensamento Cristão, popularmente conhecido como NPC. Foi uma bênção. Este
grupo é composto por pessoas que desejam servir a Igreja a fim de vê-la se manifestar
sobre a terra através de Sua diversidade. Contudo, ele foi preterido por não “atender
o sistema doutrinário” que a Igreja ao qual fazia parte adotou. Sistema
doutrinário. O conheço bem. Não, Ele não trata Jesus como essência. Jesus é visto apenas como Aquele que, ao chamar 12
discípulos, utilizou um método revolucionário. Isso mesmo. O culto a Jesus não
é à Sua pessoa (quem Ele é), mas ao método que Ele utilizou (o que Ele fez).
A
verdadeira Igreja cultua a Jesus por aquilo que Ele é. Por isso é
marginalizada, pois rompe com qualquer outro padrão ético que não seja
desdobramento do fato de Jesus ser a essência.
O NPC, assim como outros – incluo, claro, a congregação a qual faço parte,
entre outras - cultua Jesus por aquilo que Ele é, e não por aquilo que Ele fez
somente. Sim, sabemos que não somos perfeitos. Longe disso. Não temos o pleno
conhecimento da Verdade. Mas isto não nos impede de repudiarmos aqueles que
dizem possuí-la através de uma “revelação especial” ou “estratégia”.
Li
recentemente um texto de um pastor que afirmou: “Falo em nome do Senhor”.
Cuidado com aqueles que se dizem profetas! Apesar do Espírito Santo
ainda agir sobre Sua Igreja, não há ninguém que possa falar com tamanha
ousadia. Este era um termo comum aos profetas do A.T, já que ele ainda estava
em formação. Nem os apóstolos ousaram fazer tal acinte, pois tudo o que diziam
estava respaldado no A.T. A autoridade que possuíam era proveniente do fato de que, além de serem
escolhidos pelo próprio Cristo por terem andado com Ele, seus ensinos estavam
baseados nas Escrituras. Em outras palavras, tinha Jesus como essência.
É
claro que o NPC e outras congregações que, por amor ao Evangelho genuíno que
ainda não alcançaram, caminham na contramão desta pseudoigreja com suas visões eclesiásticas e proselitismos
doutrinários, são vistos como os marginalizados, como a igreja não oficial, à semelhança de como o cristianismo era visto
até o quarto século. Somos - me incluo neste contingente - criticados e
classificados como “rebeldes” e “dissidentes”. Ou melhor – ou seria pior? -,
somos chamados de “doentes na alma”. Ao ouvir tal sentença, lembro-me das
Palavras de Jesus: “Eu não vim para os sãos,
vim para os doentes.” (Evangelho segundo Marcos 2:17)
Sei
que os monopolistas da fé, na avidez de protegerem seus feudos, se
levantarão esbravejando seus disparates. Por mais que tentem, a Verdade será
manifesta. Como o próprio Jesus afirmou: “Depois
de conduzir para fora todas as suas ovelhas, vai adiante delas, e estas o
seguem, porque conhecem a sua voz. Mas nunca seguirão um estranho; na verdade,
fugirão dele, porque não reconhecem a voz de estranhos.” (Evangelho segundo
João 10:4-5). Por mais que estes monopolistas tentem minar a veracidade bíblica
de textos como este que você lê descaracterizando-os, as verdadeiras ovelhas de
Cristo ouvirão a voz Dele e O seguirão. Não sou eu quem digo. Apenas reproduzo
o que o próprio Jesus afirmou.
Isto
apenas atesta que estamos no Caminho certo, cientes de que ainda não O
alcançamos. Fazemos nossas as palavras de Paulo: “Não que eu já tenha obtido tudo isso ou tenha sido aperfeiçoado, mas
prossigo para alcançá-lo, pois para isso também fui alcançado por Cristo Jesus.
Irmãos, não penso que eu mesmo já o tenha alcançado, mas uma coisa faço:
esquecendo-me das coisas que ficaram para trás e avançando para as que estão
adiante, prossigo para o alvo, a fim de ganhar o prêmio do chamado celestial de
Deus em Cristo Jesus.”
(Filipenses 3:12-14 – Ênfase acrescentada).
Notaram?
O nosso galardão não está atrelado à devoção a um sistema eclesiástico ou
modelo doutrinário – embora, repito, a doutrina, como ética, seja importante. Mas está atrelado a Jesus Cristo.
Se a Igreja estivesse crescendo, sua atuação e consequente influência sobre a sociedade seriam positivamente notórias. (Matheus Vianna)
ResponderExcluirSe a Igreja estivesse crescendo, sua atuação e consequente influência sobre a sociedade seriam positivamente notórias. É isso professor Matheus, o nosso crescimento em número no Brasil não surtiu o efeito que se esperava, faltou qualiadade.
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