Matheus
Viana
Jesus preconizou: “Conhecereis
a verdade, e a verdade vos libertará.” (Evangelho segundo João 8:32).
Mediante tal afirmação, deduzimos que a liberdade está pautada na verdade.
Definir o que seja, de fato, esta verdade citada por Jesus demanda uma
exaustiva reflexão que não faremos neste momento. No entanto, podemos defini-la,
em nosso contexto, como um padrão ético/moral e de normalidade.
Todo ser humano tem sua vida, e consequentemente sua
liberdade, pautadas em um padrão. Mesmo o mais relativista dos homens – podemos usar
Nietzsche como exemplo - tem a necessidade de definir o que é certo e errado,
normal e anormal. E isto é impossível sem um padrão pré-estabelecido que sirva
como referência. (Não deixe de ler o texto O
que é normalidade?)
O próprio fato de uma pessoa não acreditar na existência do
certo e do errado, mas de que tudo é relativo, é desdobramento de sua devoção a
um padrão moral e de normalidade. Pois esta pessoa classifica o absoluto como
errado e o relativo como certo. Para o imoral, por exemplo, fazer o que
contraria a ética, e consequentemente a moral, é a coisa certa e normal a se
fazer.
C. S. Lewis, elucidando sobre a teoria da Lei moral, afirma que
o fato de termos a consciência do certo e errado é indício da existência de um
padrão. Ou seja, a nossa capacidade de discernir o certo e o errado é produto
de sermos submissos a um padrão moral que definimos para nós mesmos. E este
padrão moral é reflexo da existência de uma Lei moral superior a nós que, de
forma direta ou indireta, nos influencia. É semelhante ao fato de que nossa
existência atesta a existência – ainda que ela já tenha falecido – de nossa
mãe.
Sem este padrão, estamos como um barco à deriva em alto mar.
Nossa vida perde totalmente o sentido e, com isso, ficamos enredados no limbo
do niilismo existencial. Isso não é ser livre, é ser libertino. Como vimos no
texto anterior, a liberdade só existe quando há uma ordem social. E esta ordem é pautada por leis e diretrizes originadas na
vontade geral dos membros de uma sociedade. Esta ordem social
nada mais é do que o estabelecimento de um padrão de normalidade.
Eis o círculo virtuoso: liberdade só pode ser exercida quando
nos submetemos ao padrão de normalidade estabelecido por Deus ao homem ou pautado por ele. Um padrão de normalidade é
constituído de ética e moral. Ética é o conjunto de leis, normas e costumes que
regem uma sociedade. E este conjunto pode ser resultado de nossa vontade conciliada com a vontade geral. Neste ponto, é
necessário evocarmos a definição de Schopenhauer sobre justiça e injustiça.
O filósofo dizia que injustiça é o ato exercido por uma
pessoa que, através da coerção física ou verbal, impedia outra pessoa de exercer
sua vontade. E justiça é o ato em que uma pessoa faz todo o possível para que a
vontade de outro seja feita em detrimento da sua. Conforme Rousseau preconizou,
uma ordem social (padrão moral/de normalidade) só pode existir mediante leis. As
leis nada mais são do que o estabelecimento da vontade geral. Algo que só é
possível quando as vontades particulares forem renunciadas de forma espontânea.
Isso, segundo Schopenhauer, é justiça. E sabemos que o pleno exercício da
justiça é essencial para o bom funcionamento de uma sociedade.
Nietzsche definiu a diferença entre moral nobre e moral
escrava. A “moral nobre”, segundo ele, está pautada na ação egoísta. Ou seja,
quando a vontade particular tem a primazia – e o total controle – sobre a
geral. Já a moral “escrava” é a pautada na não ação e no altruísmo. Portanto, a
vontade geral definida por Rousseau, para Nietzsche não passa de moral escrava.
Agora, imagine uma sociedade onde todos os seus membros optassem pela “moral
nobre”? Não haveria altruísmo. Sem altruísmo, não haveria renúncia das vontades
particulares. Sem esta renúncia, não haveria o estabelecimento das vontades
gerais (leis e diretrizes). Sem leis e diretrizes, não haveria ordem social
(padrão de normalidade). Sem ordem social, existiria apenas o caos. E no caos,
não há liberdade, mas apenas a libertinagem.
E é exatamente a Ordem
que Deus concedeu ao ser humano, que C. S. Lewis denomina como Lei moral e eu,
ousadamente, confesso, denomino como padrão de normalidade, que Jesus nos
adverte a conhecermos. Pois quando a conhecermos, algo que implica também na
plena observação a ela, seremos, de fato, livres. No entanto, esta Ordem é que
deve pautar os padrões que estabelecemos para nossa vida individual e coletiva.
Por isso Rousseau elucida: “Toda a justiça procede de Deus, só Ele é sua fonte,
porém, se soubéssemos recebê-la de tão alto, não necessitaríamos de governos e
de leis.”. E neste ponto que o Estado laico entra em ação. Não deixe de ler o
texto: Laicismo.
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