segunda-feira, 29 de abril de 2013

Mera “in”coincidência

Analisemos esta premissa do ponto de vista científico. Algo que sai do campo visual de uma criança de até nove meses, de fato, deixa de existir? Devemos afirmar, empiricamente, que algo não existe por estar além do que os olhos humanos podem ver? Uma criança de até nove meses diria que sim. Ou seja, a afirmação científica é tão infantil quanto.

Matheus Viana

Na construção da teoria do construtivismo, Jean Piaget preconiza que, para uma criança até os nove meses de vida, algo existe apenas se está em seu campo visual. Ou seja, sua mãe, por exemplo, no momento em que sai deste campo, deixa de existir.

A semelhança de tal constatação com o ateísmo – bem como com todos os desdobramentos do reducionismo – não é mera coincidência. Algo existe somente se puder ser comprovado pela "visão" do método científico e, desta forma, ser classificado como cognoscível segundo a nomenclatura platônica e kantiana.

Analisemos esta premissa do ponto de vista científico. Algo que sai do campo visual de uma criança de até nove meses, de fato, deixa de existir? Devemos afirmar, empiricamente, que algo não existe por estar além do que os olhos humanos podem ver? Uma criança de até nove meses diria que sim. Ou seja, a afirmação científica é tão infantil quanto.

É interessante a impossibilidade de dissociar o comportamento humano natural do sobrenatural. Conforme elucida Chesterton em seu livro O Homem Eterno, as evidências arqueológicas dos desenhos encontrados em cavernas durante escavações possuem várias interpretações. Uma delas é que os seres chamados de pré-históricos desenhavam, como forma de registro, suas caças.

Do ponto de vista antropológico, os desenhos enigmáticos das cavernas feitas pelos pré-históricos representavam suas relações com a natureza. Mas esta necessidade de registrar o objeto da caça é, no mínimo, intrigante. Um animal não teria – como não tem – a capacidade de desenhar – segundo a arte encontrada nos achados arqueológicos – outro animal. Daí a suposição de que estes seres eram primatas que foram se desenvolvendo até tornarem-se homo sapiens perde totalmente a sua força. Mas, por que os registros? Por que os desenhos?

Na tentativa de responderem tais questões, alguns historiadores e cientistas afirmam que estes registros pertenciam a uma espécie de ritual onde se desenhava o animal ou o ser sacrificado. Quando se estuda as mais antigas civilizações ainda existentes, constata-se que todas elas têm seus cultos e rituais. O que atesta que a necessidade de buscar o transcendental é inata do ser humano.

A torre de Babel (Gênesis 11) foi projetada com a finalidade de, além de fazer os nomes dos artífices eternizados, tocar os céus. Em outras palavras, alcançar o transcendental. O intuito que os levou a construí-la ainda persiste no coração humano: fazer nomes conhecidos e alcançar o transcendente.

Conforme afirmei em outra oportunidade (leia o texto: Perscrutando o imperscrutável), o próprio ateísmo é produto desta busca. O fato de os ateus não conseguirem alcançar o transcendental apenas pela via da razão não pode, para eles, ser considerado como fracasso. Por isso, a saída pela tangente é dizer que o metafísico não existe. É muito mais fácil dizer que o "inimigo" não existe do que confessar a derrota diante dele.

Tão interessante quanto é o fato destas civilizações antigas descreverem suas divindades com características humanas. A mitologia grega é um exemplo marcante. O hinduísmo, por exemplo, além de descrever seus deuses com traços humanos, mescla-os com traços animais. Tais fatos são tentativas de reduzir o sobrenatural ao nível natural a fim de compreendê-lo. O pensamento dos homens das cavernas ressurge. Aliás, nunca deixou de existir. Ele é apenas o reverberar de uma necessidade que se originou na ruptura da criatura chamada ser humano para com O Criador.

Isso é demonstração pura e simples da necessidade que o ser humano possui de conhecer O Criador transcendental. E Ele, a fim de supri-la, se tornou humano. Disse a um homem chamado Filipe: “Aquele que vê a mim, vê o Pai.” (Evangelho segundo João 14:9). Na esteira de tal declaração, Paulo de Tarso afirmou: “Jesus é a imagem do Deus invisível.” (Colossenses 1:15).

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Quem é o estranho?

Quem é este estranho que contemplo quando olho para o espelho? Saberemos quem somos, de fato, quando soubermos quem Ele é. O único “eu e tu”, proposto por Martin Buber, que revelará quem verdadeiramente somos só pode ser realizado com o Jesus revelado pelas Sagradas Escrituras.

Matheus Viana

Quem era o estranho com barba e cabelos longos, roupagem rude de pele de camelo, que se encontrava no deserto convocando seus ouvintes ao arrependimento? Quem era o homem que ficava junto às margens do Jordão batizando aqueles que a ele se achegavam?

Estas eram as questões as quais os judeus buscavam respostas. O homem respondeu de maneira concisa: “Não sou o Cristo!” (Evangelho segundo João 1:20). Por que ele emitiu esta resposta? Era ciente de que os judeus aguardavam o Messias. Ele também O aguardava. Mas as perguntas não eram se ele era o Cristo, e sim quem ele era. Era sacerdote por direito e herança, embora não exercesse o ofício sacerdotal nos moldes da religião judaica.

A resposta deste homem não foi satisfatória. “Quem é você?”, perguntaram-lhe em seguida. Mas a questão não era fruto da razão de quem perguntava. E sim a transferência da dúvida de terceiros: “Dê-nos uma resposta, para que a levemos àqueles que nos enviaram. Que diz acerca de si próprio?” (Evangelho segundo João 1:22)

Estamos rodeados de pessoas querendo saber quem somos (Hebreus 12:1). Não há como fugir deste fato. Ele é demonstração da necessidade que temos de nos conhecermos. E esta necessidade, por sua vez, é desdobramento da necessidade que temos de conhecer a nossa origem. Martin Buber, tentando suprir esta necessidade, propôs a teoria do “eu e tu”, que diz que conheceremos a nós mesmos na medida em que conhecermos o nosso próximo. Pois Buber afirma que o próximo é um reflexo da nossa personalidade, o nosso espelho. Portanto, segundo ele, quando olhamos a personalidade do próximo, enxergamos a nossa própria existência.

O estranho questionado era João, o Batista. Mas ele não respondeu seu nome ou o que fazia. Respondeu quem era de forma peculiar: “Eu sou a voz do que clama no deserto.” (Evangelho segundo João 1:23). Se usarmos a teoria aristotélica da essência/acidente, podemos dizer que tal característica definia a essência de João.

Voz do que clama. Sim, João era a voz do próprio Deus que não clamava mais no Templo repleto de um sacerdócio corrompido pelo poder romano. Era a voz de um Deus que escolheu aquele que foi rejeitado pela religião humana, embora tivesse direito, por parte de pai e de mãe (Evangelho segundo João 1:5), de exercer o ofício sacerdotal. Deus também não quis que João se misturasse a um sacerdócio corrompido. Por isso lhe enviou ao deserto, a nova morada de Deus naquela ocasião.

Antes de entrarmos no exercício de conhecermos a nós mesmos, façamos alguns questionamentos. Quem eram os “judeus de Jerusalém” que queriam saber quem João era? A cúpula religiosa. Contextualizando este nicho para a atualidade, podemos dizer que se refere aos “portadores” da promessa. Recentemente fiquei chocado ao ouvir um pastor dizendo que aqueles que não se submeterem a uma determinada visão estratégica, comum no movimento neo-pentecostal que mistura evangelismo de massa, auto-ajuda cristã e teologia da prosperidade, não fará parte da “grande reforma” e do “avivamento” dos últimos dias.

Assim como os “judeus de Jerusalém” se portavam como os “portadores das promessas” declaradas pelos profetas a respeito do Messias, cristãos ligados a movimentos e “visões” se portam como os portadores das promessas triunfalistas dos últimos dias. Não podemos deixar, infelizmente, de citar o separatismo em que esta realidade desencadeia: “Donos da verdade” x “ignorantes da fé”. Será? Jesus diz que veio para os doentes, e não para os sãos. Quem é doente e quem é são nesta história? Jesus emitiu, nas entrelinhas, a resposta: todos somos doentes.

Algo interessante implícito na resposta de João Batista nos remete à sua negação ao chamado complexo messiânico. Ou seja, o complexo que nos emite o sofisma de que grande parte do mundo será redimido por conta do sacrifício de Jesus “através de seu ministério”. “O que seria de Deus, e da humanidade, sem o meu ministério?”. Acredite, há quem pense assim. Por isso, quando Deus levanta um ministério diferente dos moldes destes “reformadores contemporâneos”, logo é questionado. “Quem é você? O que fazes?”.

Sim, a advertência de Paulo é pertinente e necessária: “Examine todas as coisas e retenha o que é bom.” (I Tessalonicenses 5:21). Mas ela não anula a consideração que devemos exercer quando detectarmos que algo realmente provém de Deus. Não há fórmula mágica, tampouco única, para discernirmos o que é de Deus ou não é. Não há “10 passos para isso” nem “12 semanas para aquilo”. Não há “taylorismo cristão”, pois Deus possui multiforme e sabedoria (Efésios 3:10). Ou seja, Ele age como e quando bem entender. É um erro dizer que algo não provém de Deus por não se conformar com os moldes estabelecidos por homens, assim como João não se configurava com o molde exercido por um sacerdócio corrompido, e por uma religião que não reconheceu O Deus encarnado.

Feita uma breve e sucinta análise sobre os questionadores, analisemos as questões. A primeira delas é: “Quem é você?”. Façamos esta pergunta a nós mesmos. A proposta socrática ressoa sobre a nossa existência: “Conhece-te a ti mesmo”. Baseado nela (creio eu), o apóstolo Paulo, usando a ocasião da Ceia, reverberou: “Examine-se cada um a si mesmo.” (I Coríntios 11:28). Calvino, em uma de suas institutas, adverte: “O verdadeiro conhecimento de nós mesmos é dependente do verdadeiro conhecimento de Deus”. Ponto final.

Mas como conheceremos um Deus invisível, metafísico, e por isso, conforme preconizou Kant, incognoscível? Analisando Aquele que é a imagem do Deus invisível (Colossenses 1:15), o próprio Deus encarnado (Evangelho segundo João 1:14). O sociólogo e teólogo Ariovaldo Ramos elucida: “Jesus é o que Deus é e o que todo ser humano deve ser”. Por quê? Porque fomos formados, em nossa essência original, à imagem e conforme a semelhança de Deus. Ou seja, fomos feitos segundo uma forma, um modelo. E esse modelo é o próprio Jesus. Portanto, saberemos quem somos, de fato, quando soubermos quem Ele é. O único “eu e tu”, proposto por Buber, que revelará quem verdadeiramente somos só pode ser realizado com o Jesus revelado pelas Sagradas Escrituras (Evangelho segundo João 5:39). Qualquer outro modelo é falsificação barata. É um espelho fosco.

Sim, João nasceu antes da encarnação de Deus. Mas ele sabia quem era por conhecer e viver a Logos, a mesma Palavra que profetizava sobre a encarnação de Deus por todo o Antigo Testamento: Jesus, o Cristo. Por isso, respondeu: “Eu sou a voz do que clama do deserto: Façam um caminho reto para o Senhor.” (Evangelho segundo João 1:23). A resposta de quem somos, assim como a de João, deve consistir em essência e propósito. Em Jesus, temos a revelação de nossa essência e também de nosso propósito. Um não existe sem o outro.

Quem é este estranho que outros questionam, e que contemplo quando olho para o espelho?

sábado, 13 de abril de 2013

Ponto de partida


Muitas são as questões a serem respondidas. O motivo é simples: a dúvida é o fator motriz da existência humana e, por conseguinte, de tudo que está relacionado a ela. Esta dúvida está pautada na própria existência humana.

Matheus Viana

Qual tem sido a nossa reação diante de tantos erros e injustiças existentes no mundo? O que é certo ou errado? O que é justo ou injusto? Qual o padrão de normalidade que fundamenta e determina tais definições? Qual a origem deste padrão? O que é normalidade? Qual a razão de sua existência? Ela existe? Qual sua origem?

Muitas são as questões a serem respondidas. O motivo é simples: a dúvida é o fator motriz da existência humana e, por conseguinte, de tudo que está relacionado a ela. Esta dúvida está pautada na própria existência humana. Explico.

Na tentativa de respondê-la, para a partir de então tentar responder todas as outras questões que surgem consequentemente, alguns afirmam que a resposta é o acaso. Não houve um tempo preciso – mesmo o “tempo” de Planck é inconclusivo. Não houve um propósito. Não houve um padrão pré-estabelecido. Uma explosão acidental chamada “Big Bang” aconteceu, de acordo com alguns, e dela surgiu o universo, as galáxias, os planetas e toda a natureza, incluindo os seres humanos.

Mas como? Qual foi o processo? A teoria evolucionista é pura especulação. A explicação fenomenológica é insatisfatória e inconclusiva. O processo evolutivo, como o próprio nome diz, explica a “evolução” da espécie humana, mas de maneira nenhuma sua origem. Se somos oriundos de uma explosão cósmica espontânea, onde se encaixam as Leis da termodinâmica (todos os processos naturais estão sujeitos às leis naturais, e estas leis não surgem de forma espontânea) e da Biogênese (vida gera vida), por exemplo?

Se o Big Bang de fato existiu, a origem humana, como afirmam os evolucionistas, foi produto da colisão entre matéria e energia, e não de vida capaz de gerar um ser vivo, conforme preconiza a Biogênese. Deve-se considerar também o caráter idealista que fundamenta esta teoria: o ateísmo. O que compromete o caráter científico.

Refletir apenas no contexto científico na tentativa de encontrar respostas satisfatórias para as questões existentes é se submeter a um reducionismo. O cientificismo (ou naturalismo) tenta, mas o insucesso é notório. O ser humano não pode ser analisado apenas sob o prisma científico (com todos seus desdobramentos e ramificações). O motivo é porque sua origem também não pode.

Ainda que o cérebro comande as ações humanas (dos pontos de vista cognitivo e motor), tal fato não anula o de termos uma alma. Platão, que dizia que o ser humano é governado pela razão, - que para ele é representada pelo cérebro – em sua teoria dicotômica “consciência/corpo”, preconizou que o ser humano também era munido dos sentimentos de coragem (região do peito/tórax) e de desejo (região do baixo ventre). Uma tentativa de descrever a integralidade humana.

A psiquiatria, juntamente com a psicologia, com vasta contribuição da psicanálise, não faz distinção, ao conceituar a alma, entre sentimento e intelecto. Na teoria “somática”, a alma é completamente ligada ao corpo. Sendo assim, a neurociência, por exemplo, não é capaz, por si só, de responder todas as questões sobre a existência humana.


O primeiro passo é procurarmos responder de forma satisfatória, sem reducionismos ou especulações, as questões sobre a origem e propósito de nossa existência. Pretensão demasiada? Claro que é. Talvez não alcancemos tamanha pretensão. Mas a tentativa, feita de forma ampla, nos leva para mais próximo dela. Por que não ousar?

terça-feira, 2 de abril de 2013

Reducionismo proposital


Matheus Viana

Declarar a falácia de que Deus é produto da mente humana nada mais é do que demonstração da necessidade que o ser humano tem de conhecê-Lo. A questão é que o desejo de Deus vai de encontro a esta necessidade. Deus se fez homem, ou seja, reduziu-se à forma humana (Filipenses 2:6-8) para que se tornasse cognoscível (capaz de ser conhecido). Este é o maior fenômeno (na visão kantiana) de todos os tempos.

A tentativa de reduzir Deus a um mero produto da alma humana é sintoma da insanidade de transformar o subjetivo em objetivo; o abstrato em concreto; o metafísico em natural. Em outras palavras, se o ser humano é capaz de “produzir” Deus com suas emoções e pensamentos, ele se torna seu próprio deus. É este o raciocínio do filósofo alemão Feuerbach em sua afirmação: “o homem é seu próprio deus”.

Esta tentativa é desdobramento da necessidade que o ser humano possui de compreendê-lo em detrimento de suas limitações. A questão é que o desejo de Deus vai de encontro a esta necessidade. Deus se fez homem, ou seja, reduziu-se à forma humana (Filipenses 2:6-8) para que se tornasse cognoscível (capaz de ser conhecido). Este é o maior fenômeno (na visão kantiana) de todos os tempos. Mais do que fenômeno, tal fato é a síntese entre fenômeno (cognoscível/explicável) e o númeno (incognoscível/inexplicável). 

Por isso, Jesus afirmou: “Se vocês realmente me conhecessem, conheceriam também o Pai.” (Evangelho segundo João 14:7). E a obtenção deste conhecimento se dá também através da razão. O próprio Jesus preconizou: “Examinai as escrituras, pois elas de mim testificam.” (Evangelho segundo João 5:39). Mas esta razão é complementada pelo metafísico. Pois Jesus também afirmou: “Mas o consolador, o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, vos ajudará, vos ensinará e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito.” (Evangelho segundo João 14:26). Parakletos é a expressão original traduzida como consolador. Para – ao lado; kletos – chamado, convocado. Eis a síntese entre o fenômeno (cognoscível/razão – escrituras) e o númeno (incognoscível/metafísico – Espírito Santo) que Immanuel Kant, equivocadamente, desmembrou em duas partes distintas que mais tarde Hegel classificou como tese e antítese.

Sem a coesão desta síntese é impossível conhecer e compreender Deus. O reducionismo cientificista é resultado desta dicotomia kantiana. Como a tentativa de compreender e conhecer a Deus apenas pelo método científico (fenomenologia), ignorando o metafísico, é ineficaz, alguns partem para a hipótese – já que não há comprovação satisfatória – de que Deus, conforme Nietzsche, Freud entre outros afirmaram, é produto da alma humana. A partir disto, a insanidade vem à tona.

O apóstolo Paulo indagou: “Quem conheceu a mente de Deus para que possa instruí-lo?” (I Coríntios 2:16). Ninguém. Mas somente aqueles que possuem a mente de Cristo: a síntese entre razão e fé; entre fenômeno e númeno; entre o explicável e o inexplicável, podem obter este conhecimento, claro, sem a pretensão de instruir Deus. “Jesus Cristo é o poder (metafísico) e a sabedoria (razão) de Deus.” (I Coríntios 1:24). Quer conhecer e compreender Deus? Jesus se reduziu ao nível humano para atender tal desejo.