terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Alimento de Graça


Matheus Viana

Nos textos A prática da Graça e Ações de Graças, refletimos sobre o fato de que nossa gratidão a Deus consiste em atitudes. Elas possuem uma origem e um objetivo. A origem é a Graça de Deus a nós, manifesta no sacrifício de Jesus na cruz (I João 4:10). O objetivo é o mesmo que levou Jesus a agradecer ao Pai pelos cinco pães e dois peixes que portava em suas mãos: saciar a fome da multidão que O seguia (Evangelho segundo Marcos 6:41).

Somos famintos. Vivemos em uma humanidade faminta. O apóstolo Paulo elucidou esta fome afirmando: “A ardente expectativa da criação aguarda pela manifestação dos filhos de Deus”. (Romanos 8:19). É por isso que a esmagadora maioria aceita todo tipo de “alimento” nocivo que o mundo – sistema de pensar e agir – oferece. É por isso que o programa televisivo Big Brother Brasil, entre outras futilidades imbecilizantes do gênero, conta com a exorbitante audiência de milhões de expectadores.

Nossos filhos e alunos são famintos. Por isso têm aceitado todo tipo de “alimento” que lhes são oferecidos. Jesus, como homem, foi tentado. A primeira proposta que lhe foi feita foi a de transformar pedra em pão. Ou seja, transformar os princípios eternos e imutáveis de Deus ao ser humano em um alimento momentâneo. Por quê? Porque Jesus, após jejuar 40 dias e 40 noites, teve fome. Isso mesmo! A proposta veio de encontro com sua necessidade. Não é diferente conosco. Tampouco com nossos filhos e alunos.

Infelizmente, muitas garotas, em tenra idade, têm transformado a pedra chamada virgindade em um pão nocivo chamado fornicação. A indigestão da tristeza, da depressão, da auto-desvalorização e da gravidez precoce, em alguns casos, é inevitável. Muitos garotos têm transformado a pedra chamada pureza sexual e moral em pães da cobiça da carne e da concupiscência dos olhos, onde contemplam toda sorte de imoralidade e pornografia na televisão e na internet. Transformam a pedra da honra e da obediência no pão da desobediência.

O único alimento capaz de saciar, por completo, a fome da humanidade é o pão do qual Jesus falou: “Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Se alguém comer deste pão, viverá para sempre.” (Evangelho segundo João 6:51). No entanto, conforme Jesus disse aos Seus discípulos em relação à multidão presente: “Dêem-lhes vocês algo para comer”. (Evangelho segundo Marcos 6:37). Ou seja, nós é que devemos distribuir este Pão aos famintos.

Esta distribuição, todavia, começa com a nossa atitude de gratidão. A mesma que Jesus realizou: “Tomando os cinco pães e dois peixes e, olhando para o céu, deu graças e partiu os pães. Em seguida, entregou aos seus discípulos para que os servissem ao povo”. (Evangelho segundo Marcos 6:41). A ação de graça que alimenta. Que distribui aos famintos o verdadeiro “Alimento de Graça”.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Meros adendos


Matheus Viana

O sábio Salomão advertiu: “Meu filho, guarde consigo a sensatez e o equilíbrio, nunca os perca de vista”. (Provérbios 3:21 – Nova Versão Internacional). Equilíbrio e sensatez. Embora sejam alvos de todo ser humano em condição salutar, suas carências em nós têm descaracterizado, consequentemente, a Igreja de Jesus. A tentativa de alcançá-los é a causa dos extremos.

Na busca pela santidade, muitos se tornam legalistas. Mas a nova onda da “liberdade em Cristo”, em muitas nuances, produz o extremo da libertinagem. Esta “modalidade da fé” preconiza que a Graça e o amor de Deus – demonstrados de forma radical na Cruz do Calvário –, apesar de alcançarem o pecador em seu estado deplorável, não confrontam seus pecados e não exigem dele mudanças de mente e de comportamento. Ou seja, arrependimento.

Ignoram o fato de que Jesus, contrariando a lógica, exercia sua santidade radical com equilíbrio e sensatez. Embora estabeleceu misericórdia e não fez distinção entre santos e pecadores, como homem tocou o ponto fulcral das pessoas com as quais se deparou de modo que se arrependessem e abandonassem suas más condutas. Veja, por exemplo, os episódios da mulher samaritana (Evangelho segundo João 4:16-18) e da mulher pega em flagrante adultério (Evangelho segundo João 8:11).

Existem os tradicionais que impedem a renovação do Espírito Santo. Na contramão, estão os que buscam abandonar as “tradições da religiosidade frívola” e acabam caindo na insensatez de criar, conforme o apóstolo Paulo elucida, “ventos de doutrinas” (Efésios 4:14) e são, como barcos a vela, guiados por eles.

Uma espécie de numerologia “bíblica” adquire caráter profético. Patuás e adereços tornam-se utensílios e objetos de fé. A lista é longa: rosa ungida, vassoura do descarrego, pulseira da aliança, arca da prosperidade, cajado de Moisés... Rudimentos que a Cruz de Cristo substituiu e os anulou por completo. O discurso de Lutero contra a “sacralidade” das relíquias da Igreja no Século XVI é atual e encontra pouso, pasmem, no meio protestante.

Diante de tudo isso, questionemos e reflitamos: Por que este descalabro? Por que a Igreja se tornou tão descaracterizada? Paulo sintetizou suas características: “... gloriosa, sem mácula nem ruga, santa e inculpável”. (Efésios 5:27). Gloriosa: que reflete o caráter de Jesus, a plena personificação da Glória de Deus aos homens (Evangelho segundo João 1:14, Colossenses 1:15).

Sem mácula: sem pecado, imaculada. Que ama o pecador, mas que dissemina e viabiliza a ele o arrependimento genuíno (Evangelho segundo Mateus 3:8). Sem ruga: renovada pela ação do Espírito Santo, mas sem abandonar os princípios imutáveis das Escrituras. Invenções e entretenimentos humanos, oriundos de interpretações bíblicas equivocadas, cujo intento é o alcance de objetivos pessoais, devem ser descartados.

Santa: separada das coisas do mundo – sistema de ser, pensar e agir – que o apóstolo Paulo orientou a não nos conformarmos (Romanos 12:2), observando a oração sacerdotal de Jesus de que não sejamos tirados dele (Evangelho segundo João 17:15) a fim de sermos sal e luz (Evangelho segundo Mateus 5:13-14).

Inculpável: fundamentada na Graça de Deus que nos justifica (Romanos 8:1) e nos santifica. Que possui e nutre a consciência de que apenas Ela – que abarca nossa resposta a Ela (Leia os textos: A prática da Graça e Ações de Graças) – é que fará com que se conforme às características salientadas explicitamente nas Escrituras. Seu alicerce é Jesus (Efésios 2:21) - Verdade óbvia, porém esquecida. E não a busca pelo sucesso em sua conotação secular. Jesus disse: “E nesta pedra, eu edificarei a minha igreja...”. (Evangelho segundo Mateus 16:18). Pedro, neste contexto, simboliza o fato de que somos meros adendos. Pequenas pedras colocadas sobre a Rocha principal. Portanto, sigamos o Seu modelo, não o nosso.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Disposição infantil


Matheus Viana

Jesus certa vez disse: “Eu lhes asseguro que, a não ser que vocês se convertam e se tornem como crianças, jamais entrarão no Reino dos Céus”. (Evangelho segundo Mateus 18:3 – Nova Versão Internacional).

Afirmação que exige reflexão. Já ouvi várias interpretações sobre ela. A que mais me satisfez foi a de Brennan Manning em seu livro O Evangelho Maltrapilho. Ele aborda a questão bastante explorada de sermos inocentes como uma criança e também a de adquirirmos o senso de dependência que ela possui. Mas vai além. Ele nos lembra de que crianças, nos tempos de Jesus, não eram contadas como cidadãs. Assim como as mulheres, “pecadores” – os que não cumpriam toda a Lei, como se alguém a cumprisse em sua plenitude -, publicanos e leprosos, faziam parte do “segundo escalão”.

Sim, Jesus veio para os pobres de espírito, os aflitos, os rejeitados, os marginalizados... Enfim, para aqueles que não possuem valor social. Mesmo assim, Sua mensagem é mais ampla. Quando resolvi ler este texto bíblico novamente, veio à minha mente o fato de que uma criança está sempre disposta a aprender.

Apesar de “inocentes”, crianças já nascem pecadoras (Salmo 51:5), ou seja, propensas para o mal. Por isso, não é apenas a “inocência” infantil que Jesus quis abordar. Penso que, ao fazer tal afirmação, se referiu à necessidade e desejo de aprendizado que a criança possui. Não é a toa que na fase posterior, a da adolescência, o ser humano é acometido pela síndrome do “sabe-tudo”, mesmo não sabendo.

Como professor, detecto facilmente esta discrepância. É comum em minhas aulas no ensino médio eu explicar o conteúdo e, ao fazer a questão: “Alguém tem alguma dúvida?”, todos dizerem “não”. Os resultados das provas, no entanto, revelam exatamente o contrário. O desinteresse em aprender é, podemos dizer, bastante comum nesta fase.

Ao analisarmos o texto, vemos que a conversão – mudança de mente (arrependimento), de comportamento e de conduta – não é suficiente para herdarmos o Reino dos Céus. É preciso também ser como uma criança. Estar sempre disposto a aprender. Por isso Jesus, antes da afirmação aqui analisada, disse: “Aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração”. (Evangelho segundo Mateus 11:29). Entretanto, só aprende quem está disposto a se submeter ao Seu ensino. Jesus confrontou severamente a cúpula religiosa de Sua época por se julgar sábia pelo fato de conhecer a Lei mosaica. E, por isso, não estava disposta a aprender de Seu Evangelho.

Cabe aqui um contraste. Devemos nos lembrar de que o fato de sermos “crianças” não anula a necessidade de amadurecermos a fim de que alcancemos a “estatura do varão perfeito”. (Efésios 4:13). O próprio Jesus cresceu em sabedoria, estatura e graça diante de Deus e dos homens (Evangelho segundo Lucas 2:52). Em outras palavras, adquiriu como homem plena maturidade.

Amadurecer não extingue a nossa necessidade de aprender. O sábio Salomão adverte: “Confie no Senhor de todo o seu coração e não se apóie em seu próprio entendimento; reconheça o Senhor em todos os seus caminhos, e ele endireitará as suas veredas. Não seja sábio aos seus próprios olhos; tema o Senhor e evite o mal”. (Provérbios 3:5-7).

Conhecer a Deus equivale a aprender Seus ensinamentos. Foi por isso que o próprio Jesus afirmou: “Examinai as Escrituras, pois elas de mim testificam”. (Evangelho segundo João 5:39). Foi por isso que, milênios antes desta afirmação, o profeta Oséias advertiu: “Conheçamos o Senhor, esforcemo-nos por conhecê-lo”. (Oséias 6:3).

Reconhecermos que não sabemos o suficiente e nos dispormos a aprender são atitudes oriundas de mentes e corações sábios. Não é a toa que Sócrates, considerado o maior de todos os filósofos clássicos, afirmava: “Sei que nada sei”. Que tenhamos esta disposição infantil.